Os muros da Palestina, do Brasil e do mundo

Neste espaço, publicaremos as reportagens produzidas pela equipe do jornal Extra Classe, com o apoio do Sinpro/RS e da Fetee/Sul.

Comunicação Sinpro/RS
Debate | Publicado em 29/11/2012


Cobertura especial
Fórum Social Mundial Palestina Livre
Os sindicatos filiados a CUT organizaram um coletivo de comunicação para fazer a cobertura jornalística do Fórum, que iniciou hoje, 29, e se estende até 1º de dezembro. Neste espaço, publicaremos as reportagens produzidas pela equipe do jornal Extra Classe, com o apoio do Sinpro/RS e da Fetee/Sul.

Os muros da Palestina, do Brasil e do mundo
Debate sobre muros, bloqueios e apartheid transcendeu a Palestina e contextualizou esse tema no quadro da crise do sistema capitalista internacional. Figura do apartheid não deve ser usada apenas como uma comparação com a África do Sul, mas sim como uma violação ao direito internacional, diz ativista sul-africano. Palestinos estão sendo divididos em guetos dentro de seu próprio território, denunciou Jamal Juma. Para o presidente da CUT, o maior muro de todos é o sistema capitalista, cuja crise não se limita à Europa e já ameaça a democracia na América Latina e no Brasil, que assiste hoje ao início da construção de um processo golpista, alimentado pela mídia e pelo Poder Judiciário.

Marco Aurélio Weissheimer, para o jornal Extra Classe (Sinpro/RS)

Por um mundo sem muros, bloqueios, discriminação racista e patriarcado. Esse foi o tema da mesa realizada na manhã desta sexta-feira, na Usina do Gasômetro, em Porto Alegre, dentro da programação do Fórum Social Mundial Palestina Livre. A atividade tratou dos muitos muros – físicos, econômicos, políticos, culturais e religiosos – que ainda segregam milhões de pessoas em todo o mundo. A situação do povo palestino tornou-se paradigmática desses muros que não existem para a chamada grande imprensa. Falou-se e fala-se muito do Muro de Berlim, mas muito pouco do muro construído por Israel nos territórios palestinos, ou do construído pelos Estados Unidos na fronteira do México ou naquelas barreiras que procuram empurrar, cada vez mais, os cidadãos “indesejáveis” para as bordas e cantos do mundo.

O ativista sul-africano Stiaan van der Merwe observou que há quem diga que a luta do povo palestino é um sonho, mas lembrou que a luta contra o apartheid também era um sonho e acabou se tornando realidade. O integrante do Comitê de Solidariedade à Palestina foi enfático ao falar sobre o modo como o conceito de apartheid deve ser considerado pelos apoiadores da causa palestina e de outros povos vítimas de tratamentos similares. “Não devemos usar a figura do apartheid simplesmente como uma comparação com a África do Sul, mas sim tratá-la pelo que ela efetivamente é: uma violação do direito internacional”. A definição do apartheid como um crime contra a humanidade, acrescentou, está baseada no direito internacional e não em caracterizações subjetivas. “É preciso falar em termos do direito internacional. Devemos enfatizar isso. Quando falamos do apartheid, estamos falando de uma violação da lei internacional”.

Stiaan van Merwe foi didático e insistiu nesse ponto. “Não há um apartheid em geral. Houve o apartheid da África do Sul, há o apartheid de Israel e assim por diante. Isso não é uma questão acadêmica, mas sim uma condição para fortalecer a luta nas instâncias internacionais”. O fortalecimento dessa luta, disse ainda o ativista sul-africano, tem outras três tarefas fundamentais: a primeira é organização, a segunda é organização e a terceira é organização. “É organizada que a sociedade civil internacional deve se unir, trocar experiências e traçar estratégias comuns para apoiar essa luta do povo palestino”, concluiu.

Paulo Farath, professor de Literatura Árabe na Universidade de São Paulo (USP), citou um dos braços desse sistema de apartheid nos territórios palestinos: aquele que ocorre na Faixa de Gaza. “A violação de direitos humanos é violação não importa onde ocorra. Em Gaza, o que ocorre hoje é um bloqueio terrível. Não conheço a realidade das cidades aqui do Rio Grande do Sul, mas Gaza é um território menor que São Bernardo do Campo (em São Paulo), onde vivem cerca de 1,7 milhão de pessoas em condições absolutamente precárias”. Essa situação de injustiça e opressão, lembrou Farath, vem sendo construída há muitos anos. Ele contou que em 1948, após a partilha executada pela Organização das Nações Unidas (ONU), mais de 400 aldeias foram destruídas. Hoje, os palestinos representam o maior contingente de refugiados do planeta.

O povo palestino vive hoje, nos territórios ocupados por Israel, uma situação de permanente vigilância, opressão e segregação. Jamal Juma, coordenador da campanha Stop the Wall (Parem o Muro), fez um relato desse cotidiano marcado por muros, câmeras de vigilâncias, aviões não tripulados e postos de vigilância. Esse emaranhado de barreiras e instrumentos de vigilância fazem com que os palestinos vivam hoje separados em diversos guetos, dentro do seu próprio território. Segundo o relato de Jamal, essa situação só vem piorando, agravando as condições de vida da população palestina que vive nessas áreas e aprofundando o sentimento de insatisfação e indignação contra Israel.

O “muro dos muros” e as ameaças de retrocesso no Brasil
O presidente nacional da Central Única dos Trabalhadores (CUT), Vagner Freitas, falou sobre a “mãe de todos os muros” ou “o muro dos muros”, a saber, o atual modo de produção capitalista e de organização político-econômica da sociedade. “O maior muro que enfrentamos hoje é a forma de organização da economia mundial, absolutamente consumista, financista e excludente. Esse é um muro que divide os povos entre aqueles poucos que têm muito e os muitos que têm pouco”. O sindicalista citou o exemplo do que está acontecendo com os trabalhadores europeus, submetidos hoje a uma ofensiva brutal contra direitos e conquistas. A situação é mais grave ainda, destacou Vagner Freitas, na medida em que os muros europeus representam um campo fértil para o preconceito contra imigrantes e minorias.

O dirigente sindical brasileiro não tem dúvida de que essa crise já ultrapassou o território europeu e chegará também à América Latina e ao Brasil. “Nós, da CUT, estamos muito preocupados com isso. Não creio que conseguiremos resistir por muito tempo aos efeitos dessa crise aqui na América Latina. Sem mudar o sistema capitalista não conseguiremos superar essa situação de crise e opressão contra milhões de pessoas em várias partes do mundo”.

Essa situação, prosseguiu Freitas, representa também uma ameaça para a democracia, especialmente no caso da América Latina. “A comunidade internacional entendeu muito mal o que aconteceu no Paraguai com o golpe praticado contra o presidente Lugo. E isso se deve, em boa medida, defendeu, ao papel que as grandes corporações de mídia e o Poder Judiciário desempenham hoje. “Vemos hoje a mídia agindo como força de oposição a governos democraticamente eleitos, e o Poder Judiciário mergulhando no processo de judicialização da política. E o pior é que a sociedade não tem nenhuma influência sobre o Judiciário, o que configura no horizonte a ameaça de um retrocesso democrático”.

Para o presidente da CUT, o julgamento do chamado “mensalão” foi um exemplo disso. “O STF foi utilizado pela mídia para julgar um partido político, o PT, e o presidente Lula. A CUT denuncia que, no Brasil, começa a se construir o caminho de um golpe, como aconteceu no Paraguai, como está se tentando construir agora na Argentina e como se tentou fazer na Venezuela contra o governo do presidente Hugo Chávez.